A região transfronteiriça entre o Peru e o Brasil — nas bacias dos rios Yurúa (Juruá) e Alto Tamaya — abrange cerca de 3 milhões de hectares de floresta amazônica. É uma das áreas de maior biodiversidade do planeta e lar de comunidades indígenas em isolamento e de contato recente. A Comissão Transfronteiriça Alto Juruá / Yurúa / Alto Tamaya atua para proteger esses territórios e os direitos de seus povos.
Organização e defesa territorial
Nas últimas décadas, os povos originários dessa região começaram a se organizar para buscar o reconhecimento legal de seus territórios e defender seus direitos e interesses. Seguindo a tendência posterior à promulgação da Constituição Federal do Brasil (1988) e da Lei das Comunidades Nativas do Peru (1974), foram criadas diversas associações e organizações indígenas para fortalecer suas representações políticas nessa luta e desenvolver estratégias de valorização de suas culturas e do meio ambiente.
Ausência de políticas públicas e ameaças crescentes
A negligência dos governos em relação à Amazônia, tanto no Brasil quanto no Peru, tem colocado em risco — e custado vidas — de povos indígenas dessa região, que carece de políticas públicas eficazes de proteção e promoção de direitos acessíveis às populações originárias.
Além disso, esses territórios fronteiriços enfrentam invasões, caça e pesca ilegais, aumento dos incêndios florestais e da derrubada de árvores, exploração madeireira legal e ilegal, e impactos da construção de estradas, ramais clandestinos e pistas de pouso, somados à crescente pressão ligada ao narcotráfico internacional.
Avanço da exploração madeireira e resistência Indígena
No final dos anos 1990, o avanço da exploração madeireira chegou a essa região, invadindo terras indígenas e cruzando fronteiras nacionais. Naquele período, diversas denúncias de invasões na Terra Indígena APIWTXA (Acre, Brasil) foram apresentadas aos governos brasileiro e peruano.
Os Ashaninka de Apiwtxa lideraram a resistência contra os invasores, levando o tema à imprensa internacional para alertar a sociedade sobre as graves consequências ambientais, sociais e culturais da atividade madeireira. Também iniciaram uma articulação política mais ampla com líderes Ashaninka do Peru, o que impulsionou alianças de cooperação entre comunidades indígenas dos dois países e promoveu as primeiras iniciativas de intercâmbio de informações e experiências, voltadas à construção de estratégias conjuntas para a proteção de seus territórios binacionais.
Caso Saweto e o custo humano da defesa
Em articulação com Apiwtxa, líderes Ashéninka da Comunidade Nativa Alto Tamaya–Saweto, nas cabeceiras do rio Tamaya, no Peru, começaram a denunciar a atividade ilegal de madeireiros na região.
Em setembro de 2014, quatro de seus líderes — Edwin Chota, Leoncio Meléndez, Francisco Pinedo e Jorge Peres — foram assassinados enquanto se dirigiam à aldeia Apiwtxa para discutir a continuidade das ações de vigilância e fiscalização na fronteira. Eles lutavam havia mais de uma década pela titulação de seu território no Peru e contra a atuação de madeireiros e narcotraficantes.
Diversidade cultural e linguística no Yurúa / Juruá / Alto Tamaya: territórios e povos que transcendem fronteiras.